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MUNDO E BRASIL INTOLERANTES

por Antônio Carlos dos Reis - publicado em 01/02/2014

 

Meus caros leitores, o tema é tão importante que o desdobramos em dois comentários, uma vez que  estamos seriamente preocupados com a intolerância que está desenvolvendo-se gradual e progressivamente no Brasil, especialmene no campo das ideias e dos princípios que devem nortear nossa conduta. Preocupados sim, uma vez que atrás da intolerancia vem a violência, servindo como exemplo as violentas manifestações das torcidas organizadas dos clubes de futebol, bem como dos “black blocs”.

 

A partir de 1985, ano em que foi restabelecido o regime democrático no país, após uma longa noite de 21 anos de ditadura, os brasileiros, em sua grande maioria, lutamos diuturnamente no sentido de consolidar a democracia no Brasil, a qual, segundo o estadista inglês Winston Churchill, “é o pior dos regimes, com exceção de todos os demais”.

 

Em diferentes oportunidades e comentários neste mesmo jornal, ressaltamos que ditadura nenhuma presta, seja civil ou militar, uma vez que a primeira providência que o ditador de plantão toma, logo que assume o poder, é no sentido de baixar decretos ou atos institucionais, passando por cima de direitos humanos e constitucionais, editando Lei de Segurança Nacional com graves violações aos direitos individuais, supressão do “habeas corpus” e do mandado de segurança, estabelecendo a censura para rádios, jornais e televisões, enfim, cerceando de forma draconiana a liberdade de expressão e informação, prendendo os opositores, além de nomear um gorila para chefiar um departamento de polícia política, que estabelece a prática de torturar os presos e os opositores do regime, para conseguir confissões na base de suplícios.

 

Esta é a regra de todas as ditaduras do mundo inteiro, civis ou militares, sem exceção, e como não desejamos viver sob o domínio de ditadores, temos de ficar atentos e trabalhar no sentido de fortalecer e consolidar o regime democrático.

 

Contudo, de um certo tempo a esta parte, surgem no Brasil manifestações intolerantes e violentas, envolvendo polícia civil, militar, sociedade civil, traficantes de drogas localizados em verdadeiras fortalezas nas favelas cariocas, entidades sindicais e o povão, com a infiltração dos violentos “black blocs”, os quais, na verdade, não querem protestar, mas sim promover depredações dos bens públicos e privados e arruaças nas ruas das cidades.

 

 Para citarmos apenas dois fatos de violência e intolerância, que aconteceram no ano passado,  a execução do pedreiro Amarildo, barbaramente espancado e torturado na favela onde residia e a morte da faxineira Claudia Silva Ferreira, que foi baleada e ficou pendurada no porta-malas da viatura policial, a caminho do hospital,  sendo arrastada por cerca de 300 metros, mostrando a televisão imagens chocantes do fato.

 

Ao lado dessas manifestações de intolerância e violência, aparecem outras no âmbito de lideranças políticas e partidárias, com troca de ofensas até mesmo pessoais, colunistas de jornais de grande circulação passando dos limites, esquecendo tais personagens que na democracia temos de respeitar as opiniões divergentes, por mais absurdas que nos pareçam, promover o diálogo, aceitar o contraditório, sem o que torna-se impossível a convivência democrática. O ilustre pensador, escritor e filósofo francês, Voltaire, já proclamou, em seu tempo: “Não concordo com uma só palavra do que dizeis, mas defenderei até a morte o vosso direito de dizê-las”.

 

Na eleição presidencial do ano passado, com uma disputa acirrada entre Dilma Rousseff e Aécio Neves em determinados momentos da campanha política, os dois candidatos e seus respectivos assessores quase se trucidaram, em uma demonstração de intolerância política e profundo desrespeito pelas opiniões divergentes um do outro.

 

Após a eleição, tucanos de alta plumagem insatisfeitos com o resultado das urnas, deram declarações espantosas, de alta intolerância. Observem os nossos leitores o que disse um tucano, eleito deputado federal em São Paulo, Coronel Telhada,  da reserva da Polícia Militar: “Já que o Brasil fez sua escolha pelo PT, entendo que o Sul e Sudeste(exceto Minas Gerais e Rio de Janeiro que optaram pelo PT) iniciem o processo de independência de um país que prefere esmola do que o trabalho, prefere a desordem ao invés da ordem, prefere o voto de cabresto do que a liberdade”, colocando estas barbaridades em sua página na internet e teve muitos compartilhamentos tucanos.

 

Na verdade, é certo que temos um regime e um Estado democráticos, mas cabe a pergunta: temos uma sociedade tão democrática como assegura a nossa Constituição ? Respeitamos as opiniões divergentes dos nossos adversários políticos, que são apenas adversários e não inimigos ?

 

Na Constituição brasileira, a liberdade de expressão é um direito fundamental, considerada pelos melhores doutrinadores como cláusula pétrea(art. 5º, inciso IV), o mesmo ocorrendo com relação à liberdade de imprensa(art. 220, “caput”), vale dizer, tais direitos não podem ser objeto de emendas visando alterá-los e muito menos surpimi-los. É claro também que há necessidade de não confundir liberdade de expressão com irresponsabilidade de manifestação, para que a primeira não se transforme em liberdade sem responsabilidade.

 

O resultado de tudo isso, dessa intolerancia generalizada em alguns segmentos da sociedade brasileira, é que existe um embrutecimento de atos, uma sensível perda da sensibilidade e de uma impressionante incapacidade de assimilar e compreender a beleza e a singeleza do respeito mútuo.

 

Voltaremos ao assunto na próxima edição.

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MUNDO E BRASIL INTOLERANTES 2

por Antônio Carlos dos Reis - publicado em 13/04/2014

 

Meus caros leitores, no comentário anterior falamos da intolerância política e agressiva de certos grupos insatisfeitos com os resultados das urnas. Em São Paulo, houve quem defendesse a separação dos Estados do Sul para formar o que eles chamaram de “Brasil do Sul”, deixando de sustentar os ignorantes do Bolsa Família, o que seria muito justo na opinião deles, pois essa massa de pobres e ignorantes são  sustentados pelos deputados nordestinos e pelo governo corrupto. Felizmente, é uma minoria, mas dá para entender a que ponto chegou a intolerância.

 

Da mesma forma, transpondo essa mesma intolerância para o cenário internacional, tivemos demonstrações de ódio em nome de uma religião que pede paz e o jornal Folha de São Paulo, edição do dia 01.02.2015, mostra um chocante vídeo da execução de um jornalista japonês pela facção denominada “Estado Islâmico”.

 

No dia 07 de janeiro passado, mais demonstrações de ódio e intolerância, com a invasão, por fanáticos religiosos, da redação do jornal satírico francês,  “Charlie Hebdo”, em Paris, assassinando oito jornalistas do semanário famoso pelas charges provocativas, notadamente as de cunho político e religioso. Os criminosos, ao invadir a redação do jornal, gritavam “Nós vingamos o profeta Maomé” , em demonstração de injustificável violência, uma vez que tais atitudes são prejudiciais aos povos que praticam o Islã, termo que está ligado a palavra árabe “salam”, que significa paz, revelando o caráter pacífico e tolerante da referida fé religiosa.

 

Como bem destacou a Folha de São Paulo, em editorial logo após o atentado: “impunha-se silenciar uma publicação que atuava como fonte incansável de desmoralização do que as religiões podem ter de mais triste, de mais irracional, de mais homicida. Mas, neste caso, o silêncio não pode ir além do tradicional um minuto reservado em casos de luto. Seja através de protestos, da oração, de palavras e principalmente agora, de desenhos, o mundo não pode ceder ao fanatismo”.

 

Felizmente, a repercussão negativa para os criminosos foi intensa e o mundo inteiro repudiou o ato de violência à liberdade de expressão, sendo certo que os desenhistas, especialmente os chargistas, são justamente os artistas que buscam defender os mais fracos e oprimidos. A palavra é de origem francesa, com o significado de “carga”, crítica aos governos e dogmas que confrontam os direitos humanos e a liberdade de expressão.

 

Se acontecerem abusos, há remédios para a solução, notadamente os de ordem jurídica e de manifestações pacíficas, tratando os semelhantes como humanos e não como irracionais.

 

Poucas horas depois do atentado, Paris foi tomada por uma multidão, estarrecida pela brutalidade do ato, mas não se deixou intimidar diante dos que pregam e agem no sentido oposto: o da intolerância, seja religiosa, seja política ou de qualquer outra forma de manifestação. Centenas de milhares de pessoas foram às ruas, com placas, camisetas, estampando o emblema de luto “Je suis Charlie”(Eu sou Charlie), transmitindo um recado aos intolerantes que o povo francês não se curva e não abdica de suas conquistas democráticas.

 

 Voltando ao cenário nacional, meus caros leitores, observem a que ponto chega a intolerância e o machismo. O jornal Folha de São Paulo,  publicou uma pesquisa divulgada pelo IPEA(Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), com resultados espantosos. Segundo o levantamento, uma grande parcela de brasileiros, cerca de 26%, concorda, de forma total ou parcial, que mulheres que usam roupas que mostram o corpo merecem ser atacadas. A maioria, aproximadamente 58%, também diz acreditar que “se as mulheres soubessem se comportar, haveria menos estupros”.

 

Os dados acima reproduzidos foram obtidos em pesquisa nacional, a partir de entrevistas com 3.810 pessoas de ambos os sexos, entre junho e julho de 2013 e esta mesma moioria considera as próprias mulheres responsáveis, seja por usarem roupas provocantes, sensuais e por não se comportarem adequadamente.

 

É ou não é espantoso o resultado da pesquisa, pois é certo que o que leva ao assédio sexual e ao criminoso estupro não é a roupa que a mulher está usando, mas sim a disposição de quem assedia ou pratica o estupro, revelando a pesquisa machismo, intolerância e violência de uma considerável parcela dos brasileiros.

 

Para essas pessoas, meus caros leitores, se a sua irmâ, esposa ou sua mãe usarem uma roupa mais sensual, mais justa, mostrando alguma parte do corpo, elas merecem ser atacadas.

 

Para essas mesmas pessoas, depende do decote ou do comprimento da saia para justificar o ataque ou a violência, quando é certo que todos devemos promover a tolerância zero a qualquer forma de agressão sexual.

 

O crime sexual, muito mais do que outras formas de assalto, é um tormento que pode seguir a vítima pelo resto da vida e no ano de 2013 passou de 50 mil o número de agressões sexuais contra as mulhere no Brasil, isso somente as que foram denunciadas, havendo outro tanto que por razões diversas e compreensiveis não aparecem nos levantamentos.

 

 É o cúmulo do machismo e da intolerância, que devemos condenar com todas as nossas forças.